As aventuras de dois gatinhos vira-latas Brasileiros em terras Canadenses

Saturday, May 30, 2015

Gata Borralheira

Era uma vez, num reino muito, muito distante...

... Uma doce e meiga menina (cof, cof) aprisionada num castelo de panquecas, onde a madrasta cruel estava sempre gritando com ela em "koreaninglês", uma língua terrível e assustadora, hahaha. Tá tipo assim mesmo, só estou esperando os passarinhos e os ratos virem me ajudar, que já tá fo#@ :P

Basicamente, minha rotina no IHOP é igual a da Cinderela mesmo (já até perdi um sapato no ônibus, então acho que #taserto): Tenho uma madrasta-manager bizarra, que passa o dia gritando e dando esporros em todo mundo (num inglês-koreano horroroso e gaguejante mas com um indiscutível tom de humilhação) no melhor estilo Hell's Kitchen boladão de ódio... Se fizer, leva esporro porque fez, se não fizer, leva esporro porque não fez. Se fizer errado leva esporro duplo, se fizer certo leva esporro pra fazer mais rápido. Se ajudar alguém com as tarefas, leva esporro pra aprender a não se meter, se não ajudar, leva esporro pra não ser egoísta. True story, bro, não tô exagerando em nada! Já tomei vários foras por tentar ser pro-ativa e fazer alguma coisa idioticamente simples (tipo guardar os potinhos de peanut butter no lugar) enquanto não tem nada pra fazer "das minhas tarefas", porque "essa não é a minha tarefa"! Meeooo Deoozziiiss, e agoraaahh? O mundo vai explodir porque eu guardei a caceta da manteiga de amendoim sem ser minha tarefa! Malz ae por ter tentado ajudar, tia...

Aí você pensa "&@$#*&#**$ também não vou fazer mais nada então nessa birosca, a não ser minhas 3 estúpidas tarefas: Sentar os clientes que chegam, trazer as bebidas deles e limpar as mesas quando eles saem". Resolveu? Não: Esporro. Porque? Sei lá, varia de acordo com o feeling do momento... Ou porque levei todas as bebidas de uma vez (e ela acha que vou derramar) ou porque levei metade de cada vez (e ela acha que vou demorar), ou porque eu estou andando da direita pra esquerda e deveria ser da esquerda pra... Ah, faça-me o favor, né?

O fato do trabalho ser bem basal (na vibe da Cinderela mesmo, hehe) não me incomoda em nada, de verdade, é só a "madastra" que tá pegando.... Ok, pra ser sincera, no início exigiu uma certa desconstrução das minhas auto-expectativas encarar um emprego desses, e até confesso que foi mais fácil aceitar na teoria um sub-emprego imaginário quando estávamos ainda planejando essa loucura de mudar de país ("e se for pra fritar batatas no McDonalds, ok"), do que na prática, na hora de realizar que minha profissão agora é limpar a sujeira dos outros, tendo meus lindos diplomas de mestrado e do escambau arquivados numa pasta em casa. Mas essa parte foi só uma facadinha no ego que cicatrizou rapidinho. Mas aturar todo dia várias horas de trabalho braçal generosamente salpicadas de esporros constanstes, pode ser bem challenging... Entãou vou dedicar este post ao meu Manual de Cinderela: Um guia mental para aturar a madastra má e as tarefas degradantes e ainda ter ânimo para acordar cantarolando todos os dias.

#1 Supéralo: Adoro os memes "supéralo" que volta e meia pipocam no meu Facebook, e deles tiro a inspiração para baixar a bola. O ponto fundamental é: você não é o fodão, supere isso. E eu não sou a fodona. Engole esses diplomas e sua moral inflada e cai pra vida que é isso aí.

#2 Sinta orgulho: Eu já a muito tempo reparo um fato que sempre me pareceu curioso e admirável: Que o orgulho que uma pessoa sente de seus feitos tem mais a ver com a pessoa do que com os feitos. Já vi muitos pedreiros mais orgulhosos de suas obras, de como a parede ficou lisinha e o piso nivelado, do que engenheiros dos seus projetos. Já vi mais faxineiras orgulhosas de um banheiro cheiroso do que executivas de suas reuniões em hotéis 5 estrelas. E assim eu também, que sempre senti muito orgulho da minha carreira acadêmica, agora faço o exercício silencioso de me orgulhar dos talheres simetricamente dispostos, da mancha de ketchup escondida atrás do saleiro que foi encontrada e limpa, de conseguir lembrar 8 pedidos de bebidas de uma vez só... Enfim, nenhuma tarefa é pequena demais que não mereça seu melhor desempenho, e consequentemente seu orgulho ao completá-la. Tudo bem que esse exercício fica BEM mais difícil quando você tem uma bruxa carcomida te atazanando as idéias e tentando te convencer de que tudo que você faz está errado por algum motivo bizonho ou por outro... Mas isso só faz com que seja mais importante ainda encontrar e cultivar esse orgulho.

#3 Encontre refúgio: Eu, particularmente, coloco uma boa música pra tocar na minha cachola ou evoco alguma lembrança boa ou mentalizo alguma pessoa que eu amo (vocês, meus lindos que estão me lendo aqui, podem ter certeza que em mais de um momento já sumonei cada um de vocês pra animar meus dias de gata borralheira).

#4 Recolha gotinhas de alegria: "Gotinhas de alegria" estão em vários lugares, você só precisa saber encontrar e absorver. Está um dia bonito lá fora? Olhe pela janela enquanto limpa a mesa e deixe a beleza entrar em você. Tem uma criança fofa na mesa 45? Dê um sorrisinho pra ela, ou um tchauzinho: Com certeza ela vai te "responder" e você poderá desfrutar de 3 segundos de fofura extrema. Faça uma piada ou uma gracinha com algum colega de trabalho ou algum cliente: Mesmo que a piada saia sem-graça porque você está meio amargurada, a resposta é (quase) sempre positiva, e aí você pode colher outra gotinha de alegria que você mesmo plantou.

#5 Tenha perspectiva: Aquela velha frase de "podia ser bem pior" é horrível de se ouvir, mas ajuda muito quando você está passando por desafios constantes. É um jeito meio distorcido de ter gratidão, de count your blessings, mas funciona bem quando você não está num momento particularmente grato. Eu gosto de olhar outras pessoas, muitas delas com olheiras profundas, com uma cara de acabadas, e pensar "Eu não sei os desafios pelos quais ela está passando, mas certamente eu não gostaria de estar assim tão cansada" e de repente meus problemas parecem menores, mais suportáveis. E eu lembro que minha vida na verdade é super feliz, e que eu estou exatamente onde queria estar, com quem eu queria estar e fazendo exatamente o que eu me propus a fazer.

#6 Descentralize: Não é tão fácil, mas é uma continuação do exercício anterior. Olhar as pessoas em volta fora da sua própria perspectiva (não como o que essas pessoas representam para você -chefe, cliente, colega- mas sim como o que elas são para elas mesmas) é o primeiro passo, e dele você tanto vê que os seus problemas não são tão problemáticos assim (#5) quanto que o que as pessoas fazem ou como elas agem é um reflexo delas mesmas, e não de você. Isso te leva a uma conclusão maravilhosamente simples: Eu não estou tomando esporro tanto assim pelo que eu faço, mas em grande parte pelo que a pessoa que me dá esporro é/faz/pensa. Assim, eu fico menos deprimida comigo mesma e posso voltar a ter orgulho do meu TOC por talheres simétricos! O único cuidado aqui é não reagir a essa mentalidade com "Sua vaca mal amada gritalhona!" e sim tentando extender a ela a mesma compaixão de "Não sei quais são os desafios que ela enfrenta, mas também não devem ser fáceis, pra ela ficar com esse belo humor de porco-espinho acuado".

#7 Pense macro, não micro: É importante entender, e muitas vezes se re-re-re-RE-lembrar, seus próprios motivos. Porquê estou aqui, passando por tudo isso? Ou melhor: Para quê? Eu tenho meus objetivos pessoais, e eu entendo que essa é a estrada que vai me levar a eles. Se eu ficar focada de mais nas migalhinhas de problemas que tenho agora, perco de vista a big picture. Mas se eu olhar bem pra frente, pro horizonte dos planos, percebo que tudo é passageiro e um dia eu não estarei mais aqui, e sim lá. E aí vou fazer a dancinha do caranguejo "ne-ne-ne-ne!" hahahaha.

Bom, eu podia continuar, mas vou parar em 7 pra dar sorte (e poupar vocês, hehe)...

Mas talvez esse meu conto de fadas ainda tenha um final clichê, porque meu príncipe-encantado-no-cavalo-branco está vindo me resgatar: O Tiago, com toda a moral que ele já conquistou no emprego dele (que pode ser aqui descrito como a terra-encantada-dos-sonhos-felizes, já que a chefe dele é um amorzinho-bilu-bilu comparada com a minha bosszilla, e até leva guloseimas pra ele no meio do expediente) está vendo de me descolar um emprego lá também. Assim, se isso de fato se concretizar, eu escaparia das masmorras do IHOP, manteria o outro emprego na Sears (que começa semana que vem e é só part time também) e pegaria esse aí de part time também. Mas enquanto nada disso acontece, eu vou levando a vida assim de tom em tom, e sou grata pela oportunidade de estar praticando meus skills de Cinderela-zen.

Mandem-me suas vibrações positivas também. Amo vocês. Beijos-encantados.

6 comments:

  1. Joooooo, como você é zen, caracas! Que lindo esse exercício de macro! Se a gente deixar engolir pelo comportamento alheio, rapidinho se esquece do objetivo final e que tudo isso faz parte do caminho (bem que podia ser mais easy, né!?). Você tá juntando histórias pra poder escrever um livro, certeza! :D
    Tudo vai ficar bem... você tem um céu azul no coração... Vibrando amor e alegria desse jeito vc já conectou na frequência certa!
    To torcendo pra vc conseguir um lugar com o Tiago no mundo encantado do câmbio!

    Beijo lindeza, força na peruca!

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  2. Joana, como seu diário e em dias aleatórios, acabamos não o lendo no dia de sua publicação e, portanto, já com spoilers de nossos papos no zap-zap. Mesmo assim nos divertimos muito com a gata borralheira e seu príncipe, assim como com os 7 pensamentos quase Dalai Lama. Beijos

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  4. Parabéns, Joana!
    Foi meio que sem-querer-querendo, mas vc de fato aplicou bem o termo Zen.
    Se vc um dia já se perguntou oq as pessoas fazem em um retiro Zen-budista. Agora vc sabe. É isso aí.
    Esses conflitos nos levam a essas várias reflexões e novas maneiras de ser no mundo q vc tirou.
    Claro que ao invés de uma Koreana mau-humorada, temos uma mestra que tem compaixão pela zorra q está se passando dentro de vc e quer que você cresça, sabendo exatamente quando deve martelar seu ego, e quando deve aliviar um pouco, hehehe.

    Boa sorte, e continue firme!
    Beijão!

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